Acho que escolhi tirar o curso de Psicologia por um interesse
pelas pessoas e por um desejo de as compreender e ajudar. Atravessei aqueles cinco
anos, aguçando a minha curiosidade pelo humano. E fui apurando também a
exigência de respostas verdadeiras. Causavam-me tédio, ou mesmo indignação, as
teorias curtas, as explicações redutoras, as soluções simplistas.
Apaixonavam-me, pelo contrário, os pensadores que não matavam o mistério da
pessoa.
Lembro-me, por isso, do impacto que teve em mim, ouvir falar
de Viktor Frankl e da busca do sentido da vida como motor da existência humana.
Foi uma referência fugaz e não mereceu mais do que uns minutos em cinco anos de
curso. Mas para mim foi uma janela que se abria naquela opacidade, de correntes
de pensamento reconhecidas e terapias supostamente eficazes, por dentro das
quais gritava surdamente uma espécie de grande ausência.
Tudo isto vem a propósito de um que vídeo que me fizeram
chegar, com um excerto de uma sessão de divulgação científica, conduzida por
Neil deGrasse Tyson. Em resposta a uma criança de seis anos que lhe pergunta
qual é o sentido da vida, Tyson explica que não vê o sentido da vida como algo
que se busca, mas sim como qualquer coisa que se cria, que se manufatura, para
si e para os outros. Que passa por aprender coisas novas para estar mais perto
do conhecimento do universo, influenciar eventos, moldar uma trajetória e
autoajudar-se. Aconselha a criança a explorar a natureza e a arriscar fazer
experiências à revelia dos Pais.
Voltou-me aquele sufoco, aquela nostalgia da grande ausência.
E quando aquela criança perceber em si um desejo de amor, um
desejo de justiça, um desejo de verdade, um desejo de beleza, e não encontrar
respostas à altura da sua exigência nem da sua capacidade de manufaturar?
E quando descobrir que a sua capacidade influenciar eventos
e moldar trajetórias é demasiado limitada diante da sua necessidade de ser
feliz e fazer felizes os que ama?
E quando conhecer o sofrimento, seu ou dos outros, e se
descobrir impotente para ajudá-los ou ajudar-se?
E quando estiver diante da morte de uma pessoa próxima? E
quando lhe nascer um filho?
A uma criança que pergunta pelo sentido da vida, Tyson fecha
a porta à possibilidade de uma resposta que venha de fora e possa ser
encontrada. E rompe com a grande missão civilizacional de passar à geração
seguinte aquilo que se recebeu e experimentou, na recomendação de que explore o
mundo sozinha, sem contar com os adultos.
Tyson faz da maior pergunta da vida, um espetáculo de
entretenimento, onde se disfarça o drama numa conspiração de gargalhadas
fáceis.
São duas feridas que me parece que minam a cultura ocidental
atual: a solidão e a anestesia.
Começo a semana desejosa de levar a sério os alunos que me
são confiados. De saber educar neles um desejo de significado, presente em cada
instante da vida. E de nunca os abandonar. Pelo contrário, estar grata à
companhia que me fazem e à limpidez com que me lembram a minha própria sede de sentido
para a existência.
Madalena Fontoura
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