19 de outubro de 2015

A inevitável espera, por Madalena Fontoura

Sabia que era uma conversa difícil. Mas ele estava ali diante de mim e eu cheia de vontade de o ajudar. Intimamente tinha também a pretensão de que iria conseguir chegar a algum lado. Mais do que uma vaidade em relação à minha habilidade relacional, era uma sincera disposição de ter em conta tudo o que tenho aprendido com pessoas maiores, mais humanas, mais inteiras.
Tinha decidido começar por ouvi-lo. Mas ele não quis falar. Não tinha nada para dizer. Perguntou o que é que era suposto que dissesse. Como quem se dispõe a cumprir formalidades, mas não a abrir o coração.
Então parti de alguns factos, que indiciavam que as coisas não estavam a correr bem. Tentei perceber as razões. Sem julgar, nem acusar. Só tentando ir ao seu encontro. Ele não sabia porque é que agia assim. Negou tudo o que pôde. Era a minha opinião, ele respeitava.
Tentei saber quais eram os seus desejos, os seus objetivos, o que o movia. ‘Passar de ano’ foi o máximo que consegui obter como resposta. Quanto ao futuro, mais uma vez, não sabia, não tinha nenhuma ideia e também não mostrava qualquer preocupação com o assunto.
E outras actividades, fora a da escola, alguma coisa a que se dedicasse? Mais respostas vagas. Mais subterfúgios. Mais recuos defensivos.
Por fim disse-lhe o que via nele e o que esperava. Convocando todo o bem que lhe reconheço e tentando apontar uma estrada de correcção realista e positiva. Olhava-me com um ar bem educado, mas continuava imperturbável, sem dar o mais pequeno sinal de acolhimento, sintonia ou adesão.
Eu ouvia o eco da minha voz e parecia-me um sermão. Tudo o que eu não queria para aquela conversa. Fiz as contas ao tempo. Estávamos ali há um grande bocado. Nitidamente, eu não estava a querer que ele se fosse embora sem ver algum resultado. Mas os resultados não vinham e a conversa eternizava-se. Era como se fôssemos prisioneiros um do outro.
Deixei-o ir. À saída ainda lhe perguntei se tinha servido para alguma coisa. Disse que sim, com a mesma correcção formal, sem expressão, que tinha mantido durante toda a conversa.
Fiquei sozinha com o meu desconforto, com a minha perplexidade e com a típica tentação de fazer o elenco dos culpados daquela situação, a começar nele, passando por todos os adultos que tentaram educá-lo antes de mim e, se possível, deixando-me inocente desse duro julgamento.
No meio da tristeza, acabei por me rir de mim própria. Tinha contado com todos os factores menos um: a liberdade dele, a pessoa dele, a individualidade única dele. Na verdade, faltava-me ainda um outro fator: o tempo. O dele. O da sua crise, o da sua verificação, o do seu amadurecimento. Um juízo precioso que quero guardar e fazer render.
Começo esta semana, desejando amar este meu aluno e todos os outros com um coração sereno e tenaz. Que se conserve vigoroso e criativo em todas as batalhas. E humilde e paciente na inevitável espera.
Madalena Fontoura

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