Sabia que era uma conversa
difícil. Mas ele estava ali diante de mim e eu cheia de vontade de o ajudar.
Intimamente tinha também a pretensão de que iria conseguir chegar a algum lado.
Mais do que uma vaidade em relação à minha habilidade relacional, era uma
sincera disposição de ter em conta tudo o que tenho aprendido com pessoas
maiores, mais humanas, mais inteiras.
Tinha decidido começar por
ouvi-lo. Mas ele não quis falar. Não tinha nada para dizer. Perguntou o que é
que era suposto que dissesse. Como quem se dispõe a cumprir formalidades, mas
não a abrir o coração.
Então parti de alguns factos, que
indiciavam que as coisas não estavam a correr bem. Tentei perceber as razões.
Sem julgar, nem acusar. Só tentando ir ao seu encontro. Ele não sabia porque é
que agia assim. Negou tudo o que pôde. Era a minha opinião, ele respeitava.
Tentei saber quais eram os seus desejos,
os seus objetivos, o que o movia. ‘Passar de ano’ foi o máximo que consegui
obter como resposta. Quanto ao futuro, mais uma vez, não sabia, não tinha
nenhuma ideia e também não mostrava qualquer preocupação com o assunto.
E outras actividades, fora a da
escola, alguma coisa a que se dedicasse? Mais respostas vagas. Mais
subterfúgios. Mais recuos defensivos.
Por fim disse-lhe o que via nele
e o que esperava. Convocando todo o bem que lhe reconheço e tentando apontar
uma estrada de correcção realista e positiva. Olhava-me com um ar bem educado,
mas continuava imperturbável, sem dar o mais pequeno sinal de acolhimento,
sintonia ou adesão.
Eu ouvia o eco da minha voz e
parecia-me um sermão. Tudo o que eu não queria para aquela conversa. Fiz as contas
ao tempo. Estávamos ali há um grande bocado. Nitidamente, eu não estava a querer
que ele se fosse embora sem ver algum resultado. Mas os resultados não vinham e
a conversa eternizava-se. Era como se fôssemos prisioneiros um do outro.
Deixei-o ir. À saída ainda lhe
perguntei se tinha servido para alguma coisa. Disse que sim, com a mesma
correcção formal, sem expressão, que tinha mantido durante toda a conversa.
Fiquei sozinha com o meu
desconforto, com a minha perplexidade e com a típica tentação de fazer o elenco
dos culpados daquela situação, a começar nele, passando por todos os adultos
que tentaram educá-lo antes de mim e, se possível, deixando-me inocente desse
duro julgamento.
No meio da tristeza, acabei por
me rir de mim própria. Tinha contado com todos os factores menos um: a
liberdade dele, a pessoa dele, a individualidade única dele. Na verdade,
faltava-me ainda um outro fator: o tempo. O dele. O da sua crise, o da sua
verificação, o do seu amadurecimento. Um juízo precioso que quero guardar e fazer
render.
Começo esta semana, desejando
amar este meu aluno e todos os outros com um coração sereno e tenaz. Que se
conserve vigoroso e criativo em todas as batalhas. E humilde e paciente na
inevitável espera.
Madalena Fontoura
Muito Bem e muito bom
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