27 de janeiro de 2016

Literatura e Ciências? Fácil., por José Carlos Feitor


É recorrente todos os anos ouvir os alunos a dizer que até sabiam a resposta mas não perceberam o que estava no texto. Esta frase deve ser a mais interdisciplinar porque é repetida de forma sucessiva em diversas áreas disciplinares. Até na Biologia e Geologia. Quantas vezes os alunos deixam/erram uma resposta porque não perceberam o que estava descrito nas inúmeras frases que compõem o texto introdutório de um grupo de perguntas. Pois bem, precisamos fazer algo e só se faz caminho, caminhando.

Foi o que a Professora Susana e eu decidimos fazer: um teste de Literatura e Ciências. Era preciso escolher textos que fossem transversais aos conteúdos trabalhados nas duas disciplinas. Fácil. Era preciso ver tipologias de perguntas que fossem coerentes com toda uma estrutura única. Fácil. Era preciso diversificar as perguntas para que os alunos conseguissem responder de diferentes formas. Fácil. Foi preciso sentar várias vezes para discutir a forma, o tamanho, a cotação, os critérios, a duração. Fácil. Era preciso mostrar o teste a outros professores, discutir críticas aos textos e às perguntas, alterar o que devia ser alterado. Fácil.
Um processo que durou algumas semanas e que contou com várias versões: V1, V2, versão praticamente final, versão quase final, versão finalíssima e, finalmente, versão final. Na véspera ainda descobrimos algumas gralhas e algumas incorreções que não podiam seguir num teste de Português.
Edward Hopper, Pessoas ao Sol, em Smithsonian Institution, em Washington
Ao longo do processo foi necessário ir preparando alunos, pais e restantes professores para a ideia de fazer um teste que misturasse duas coisas completamente distintas. Foi relativamente fácil pois o coração fica mais calmo quando a razão está preparada para compreender porque queremos fazer assim. Bastava olhar para nós. A visão atual, mais tecnológica, leva-me a comparar o entusiasmo que ambos sentíamos (e que era impossível de esconder) à experiência de ter um telemóvel novo, em que não conseguimos fazer/pensar em mais nada enquanto não o exploramos até à exaustão. E foi esse entusiasmo que os acalmou. “A Professora Susana e eu temos a certeza de que é uma coisa boa. Confiem”. Foi com este entusiasmo e certeza de que podiam confiar em nós, que sabíamos que só os ia ajudar a ver a realidade de uma forma maior, não compartimentada, que os educámos, diariamente.
Finalmente foi aplicado. No final lá estávamos nós, no corredor, a observar as caras deles enquanto iam saindo. Esboçavam um sorriso que, à primeira vista, era totalmente ilegível. Será de nervosismo ou de contentamento? 
Havia de tudo: os que adoraram os textos, os que eram indiferentes, os que tinham detestado. No final das contas, o saldo será sempre positivo.

José Carlos Feitor
Professor de Ciências Naturais

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