Chamo-me Inês e tenho
4 filhos.
Os suficientes para saber que ‘ter’ não é o verbo adequado.
Os filhos não são meus, foram-me dados.
Foram-me dados, para não serem meus.
Os suficientes para saber que ‘ter’ não é o verbo adequado.
Os filhos não são meus, foram-me dados.
Foram-me dados, para não serem meus.
Esta é uma verdade
que intuí quando o nosso primeiro filho começou a falar.
- ‘A mãe é má!’.
Esta é uma verdade
que confirmei quando o nosso segundo filho nunca fazia o que lhe pedíamos e
muito menos o que lhe mandávamos.
Esta é uma verdade
que experimentei quando o nosso terceiro filho esteve muito doente, a
morrer.
E esta é uma verdade
que mesmo assim, me surpreendeu, quando o nosso quarto filho foi concebido e
não planeado.
Os filhos foram-me
dados, para não serem meus.
‘O contrário do
amor, não é o ódio, mas o possuir.’
Chiara Corbella
Petrillo
Quanto mais
profundamente se ama, mais profundamente se percebe que ‘os nossos’ não o são.
O nosso filho mais
velho é muito dado. Ele é, antes de mais, o melhor amigo do seu melhor amigo, o
neto dos seus avós, o aluno da sua professora. Por isso, quando muitas vezes se
engana e em vez de mãe, chama-me o nome da professora, eu fico contente, porque
ele é mesmo o aluno da sua professora. Estabeleceu uma relação significativa,
benéfica e poderosa e, liberdade das liberdades, não é comigo.
O nosso filho ’do
meio’ sempre foi independente. Não faz o que lhe dizem, só faz o que
quer. Quando não fala aos ‘tios’, é imediatamente repreendido, e de
imediato já está enrolado nos braços dos tios não cumprimentados, a rir-se
virado do avesso, para o resgate do beijo exigido pelas regras da boa educação.
As suas primeiras experiências de perdão, são a ver o mundo ao contrário, e
liberdade das liberdades, não são connosco.
O nosso terceiro
filho é totalmente dependente. A sua vida está mês sim, mês não, por um fio.
Um fio que já se tentou manipular, controlar, medir, esticar, encurtar…mas
fugidio dança à volta das mãos da equipa médica que o segue e invariavelmente
não o conseguem dominar. Liberdade das liberdades, esse fio não está nas nossas
mãos.
O nosso quarto filho
é totalmente dependente. A sua vida está há 8 meses ligada a mim por um
cordão. Um cordão do qual irá prescindir quando estiver pronto,
prescindindo assim também de mim. Liberdade das liberdades, a sua vida não
depende de mim.
E assim, como mãe, sou
posta no lugar. Sou importante, mas não imprescindível. Importante para os
introduzir no mundo, na família, na escola, no hospital, na companhia dos
nossos amigos, para que possam um dia, provavelmente mais cedo que penso,
prescindir de mim para viverem no mundo. O mundo dos avós, o mundo dos
professores, o mundo dos amigos que perdoam má-criações, o mundo dos médicos
que desejam definir um mistério que a todos nos escapa.
Os meus filhos foram
me dados para serem do mundo e para o mundo.
Liberdade, das liberdades!
Inês Dias da Silva
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